terça-feira, 6 de agosto de 2013

A Bravo! está morta. Longa vida à Bravo!


Se uma relação é naturalmente destruidora em seu fim, nada mais desagradável que um término em que ambas as partes não chegam em um acordo mútuo. A Revista Bravo  - com sua última solene capa vista cima - da Editora Abril acabou e depois de uma relação que esperava duradora tenho de me contentar com o papel de um viúvo precoce.

Minha relação com a revista começou há três anos quando, provido de tempo e de certo dinheiro, arrisquei-me a assinar ao menos 2/3 do catálogo da Abril. Mensalmente, eu recebia informações sobre cultura, pseudo-ciência, curiosidades científicas, mercado de trabalho, ensaios fotográficos, ecologia, natureza e manuais sobre como me tornar um homem melhor.

A intenção era, após o ano da assinatura, compor um texto que nunca saiu sobre que revistas trazem um material que, de fato, fosse atraente para o leitor. Neste tempo, cortejei a Bravo! e, após sua possível despedida, convidei-a para ficar e renovamos nossa parceria.

O término da revista não é apenas o primeiro movimento do encolhimento da editora Abril. Muito menos apenas a batida afirmação de que a internet dominou o mercado impresso. Mas também um outro sinal de abate da pequena crítica cultural que temos no país.

A revista - ao lado de mais duas também quase mortas - não rendiam nem 5% da receita total da Abril. Talvez não fizesse o sucesso esperado, mas duvido que não tivesse um público fiel. Principalmente porque a morte da Bravo! é mais uma baixa neste ano ruim.

O Sabático do Estadão foi o primeiro a ser extinto. Houve manifesto pedindo sua continuidade, mas não adiantou. Equipe foi demitida e editores valeram-se da tradicional desculpa missão cumprida para considerarem o assunto encerrado.

Três meses depois, na Folha de São Paulo, a Ilustríssima seria extinta. Para não provocar a mesma contenda pública do Sabático, a Folha informou que o caderno estaria anexado ao conteúdo da Ilustrada. A Serafina nasceu, mas somente para as capitais. O interior continua no vazio. 

E, então, terceiro tiro: Bravo!. Para onde irão os leitores dos cadernos e revistas falecidas?

A Cult se mantém viva com boas matérias e seus dossiês. Mas afasta o leitor que deseja um artigo jornalístico crítico. Está mais para uma revista com ares acadêmicos do que para um panorama da cultura atual feita por reportagens.

A multiplicidade da Piauí se mantém robusta com artigos, ensaios e textos de escritores renomados. A cobertura cultural perde espaço para artigos atemporais. 

Da Editora Escala, a Conhecimento Prático Literatura permanece na resistência. Bimestralmente falando sobre literatura, aproximando-se da quinquagésima edição em uma diagramação ainda feia, que oculta um bom conteúdo. 

E para onde vamos, então? Sair à caça de nossos escritores e críticos preferidos com a esperança de que tenham um blog, uma rede social para acompanharmos aqui e ali alguma boa opinião sobre cultura?

Não há dúvida de que a internet transformou o conceito da mídia física, mas devastou também a boa opinião. Dando a qualquer um a possibilidade de ser um crítico. Até encontrarmos equivalências que nos satisfaçam, vamos nos deparar com medíocres que fazem do gosto a estética para análise, blogueiros que tem mais fama do que conteúdo, nos deixando com a sensação de que, na verdade, nos tornamos náufragos. À procura de um material que nos pareça convidativo de todas as formas. Não me importa a democracia virtual. Nunca se falou tanto sobre cultura no país. Mas nunca se falou tão mal também.

Ao decretar o óbito de cadernos culturais, os outrora grandes do panteão de nossa mídia assumem sua incompetência de não entregarem artigos bem compostos, aprofundados em sua medida, que fossem um diferencial para uma rede virtual que possui muito do mesmo. É dizer que toda uma tradição e uma redação preparada para o tema é incapaz de viabilizar artigos, ensaios, coberturas que nos deem um panorama da cultura hoje no país.

Fomos vencidos. E, ainda em luto, não aceito a queda por não encontrar equivalência. Novamente, não nego que há bons portais de cobertura cultural na rede. Nenhum com a capacidade - até mesmo de contingente - que há em uma redação tradicional. E mesmo se existam, ainda engatinham no óbvio. Ou se escondem sem querer pela quantidade imensa de sites no estilo. Gasta-se tempo para separar o joio do trigo.

Viveremos de nichos. Revistas literárias conhecidas em regiões, agregadas pela recomendação boca-a-boca. Na era da comunicação em massa, voltamos à era das trevas. Identificando um a um os críticos bons na sopa virtual.

A execução dos cadernos e revistas é uma equação simples. Não era viável. Os leitores fiéis não pagavam impressões, salários e uma redação que fazia matérias para poucos. Chegando ao cerne da questão ridícula de que o buraco é sempre mais embaixo. Vem justaposto a um país de pouco leitores, de salários que não são suficientes para o lazer, de uma cultura elitista de preços caros para espetáculos, chegando ao resultado óbvio de que não há público amplo para um revista voltada à cultura e nunca haverá se ainda estes termos forem vigentes.

E entre uma possível mudança, uma tiragem menor, para um público que deseja degustar cultura, mais vale cortes e enfoque nos cadernos que ainda vendem jornais diários e revistas. Mesmo que em tiragem inferior daquelas anteriores à explosão digital. 

E ainda retrógrado, apegado ao tácito, ao toque físico do prazer da leitura, me sinto órfão.

Um comentário:

  1. Tenho algumas considerações:

    1º - A Bravo era uma revista feita com um acabamento gráfico muito bom e com papel couchê de gramatura superior ao normal, acho que teria sido viável a editora Abril simplesmente diminuir a qualidade da impressão e do papel, cortando o preço da publicação e aumentando um pouquinho a margem de lucro, assim acho que talvez a publicação pudesse ter sido mantida;

    2º - Vendas digitais. Sério, quando vão aprender? Existe mercado, ainda insipiente, mas existe e imagino que o público da Bravo seja exatamente o público que está aberto a isso e que possui ipads e outros tablets. Se a Abril tivesse investido em vender a Bravo para esse público, por um preço - digamos - 30% mais barato, talvez pudesse ter aumentado a margem de lucro (lembremos que neste caso se elimina impressão, papel e - principalmente - distribuição) e mantido a publicação da revista.

    Parece-me que não houve vontade da Abril em manter a publicação mesmo, pois meios existiam, pelo menos para tentar.

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