domingo, 28 de julho de 2013

Histórias de Paraty (2)


A cachaça é um dos pontos fortes da cidade. E todo viajante sente-se impelido de aproveitar a cultura local e levar um pedaço dela para a casa. Decidimos comprar uma. 

Entramos na loja que descobrimos posteriormente ser uma fabricante da bebida no local. 

- Olá - digo cordial - o que me recomendam? Sou turista e o que me indicarem como bom vou acreditar. Mas espero que seja algo bom.

Um moço nos atende demonstrando conhecimento sobre a bebida. Fala de maturação, madeiras, tipos de filtragem. Nos oferece uma prova. Bebemos. A sensação é agradável, embora eu não sabia a diferença entre uma boa cachaça e uma ruim.

Resolvo levar, retiro a carteira do bolso e nada acontece. O vendedor não se move. Aproveito meu ânimo observando um senhor de idade fitando uma das garrafas.

- O senhor entende de bebida? - meneia a cabeça dizendo sim. - conhece essa pinga? Sabe se é boa?

Ele ri. O rosto gordo balança.

- Nunca vi um bêbado não tomar uma.

O velho não gosta do tipo da bebida oferecida a nós pelo vendedor. Hesita, mas aceita uma prova por cordialdade a nós. Cheira-a como mestre. Faz cara de suspense. Bebe. Afirma:

- Bebi melhores. Aqui mesmo na cidade você encontra melhor.

Fico em dúvida. O vendedor fecha a cara. Percebendo que a balança pende para o lado do velho, a quem eu decidi confiar pela barriga farta de bebida por toda sua vida, oferece a ele, não a nós, a mesma marca realizada por outro processo, superior, diz. O velho toma, afirma ser melhor, mas não há mais garrafas em estoque, exceto a utilizada para a prova.

Desisto. Peço desculpas ao vendedor pela ousadia. Mas o velho me convenceu mais do que ele. De cara fechada, tenta uma investida.

- Cada um tem um paladar diferente. 

Agradecemos, sem obter uma resposta de volta e saímos.

Dois dias depois, em outra casa de bebidas, compramos a mesma cachaça que o vendedor nos ofereceu. Derrotados por não termos encontrado em nenhum lugar da cidade a versão melhorada. 

Não entendemos nada de cachaça. Cairá bem.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Histórias de Paraty (1)

Entramos em uma dessas lojinhas de artesanato, dedicada especialmente para atrair turistas que desejam levar uma lembrança da cidade. 

Olhamos chaveiros, camisetas, esculturas, imãs, bordados, bolsas, apetrechos que se não são artesanais, parece. Na bancada em que fica o dono, um gato tigrado de pelos fartos está sentado em cima de uma caixa com alguns imãs. Nos aproximamos - adoramos felinos - e faço carinho no pescoço do bichano. O dono percebe, mas continua assistindo ao Fantástico.

Quando fazemos uma pergunta a ele, responde rapidamente e, vendo o caso do menino boliviano na televisão, aumenta o volume, não sei se para prestar mais atenção ou para demonstrar que não deseja diálogo.

Selecionamos nossas compras com o olhar atento do dono. Ele trabalha com peças pequenas, natural imaginar que furtos podem acontecer a qualquer momento.

Vamos ao caixa. Pagamos. Karina pergunta inocentemente se o gato era do dono, pois a cidade tem muitos animais transitando livremente, poderia ser o caso de apenas um agregado. Sem tirar os olhos da televisão, presa por um suporte no teto, nos responde lacunar.

- É gata.

Entregamos-lhe o dinheiro de nossas compras e, rapidamente, devolveu-nos o troco. Junto com as notas nos dá um obrigado seco.

- Qual o nome dela? - Karina pergunta.

Ele, sem tirar os olhos da televisão:

- É Cleo. Obrigado.

E, com uma bala no crânio, a conversa morre. Digo em semitom: gostamos de gatos. Pego o pequeno pacote, agradeço e vamos embora. Era o último dia do festival literário e o homem precisava urgentemente de um descanso.